Monarquia, Cidadania, Democracia


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♔ | Antecedentes da Restauração de 1640

O desaparecimento d’El-Rei D. Sebastião em Alcácer Quibir, em 1578, sem descendência, abriu caminho, em Portugal, a uma crise de sucessão dinástica que interrompeu a linha natural da Dinastia de Avis e, consequentemente, ao risco de União Ibérica. O Cardeal D. Henrique, tio-avô do rei Sebastião, sucedeu ao trono português em 1578, após a morte do Rei, contudo devido à sua idade avançada e à sua condição de religioso, não ofereceu a segurança da descendência, o que levou a uma crise dinástica após a sua morte, em 1580, e à aclamação de Filipe II de Espanha nas Cortes de Tomar, em 1581, como rei Filipe I de Portugal e que culminaria com a constituição da Monarquia Dual.


Todavia, a perda da independência portuguesa não consequência directa da morte do Cardeal-rei D. Henrique, uma vez que após o seu falecimento, apresentaram-se três pretendentes ao trono português, todos eles netos d’El-Rei D. Manuel I. D. António, Prior do Crato, D. Catarina, Duquesa de Bragança, e D. Filipe II de Espanha, este último foi apoiado pela nobreza e pela burguesia – segundo se diz comprou esse apoio.
D. António de Portugal nasceu em Lisboa, em 1531, e morreu, em Paris, a 26 de Agosto de 1595, e ficou conhecido pelo cognome de “o Prior do Crato”.
Era filho legitimado do Infante D. Luís e, desta forma, neto d’El-Rei D. Manuel I, e por isso foi um dos candidatos ao trono português durante a crise sucessória de 1580, resultado das mortes d’El-Rei Dom Sebastião em Alcácer Quibir e do Cardeal-Rei Dom Henrique, sem descendência.
Destinado pelo pai à vida eclesiástica, D. António cedo preferiu a vida mundana, o que terá contribuído, desde cedo, para a animosidade que sempre lhe reservou o seu tio o Cardeal D. Henrique, que sempre lhe negou a dignidade própria a um filho de Infante e neto de Rei.
Encontrando-se o Cardeal-Rei Dom Henrique, 17.º Rei de Portugal, muito doente, e uma vez que não tinha descendentes, pois não lhe fora concedida dispensa Papal para de casar, convocou a 11 de Janeiro, em 1580, as Cortes de Almeirim, para assim se proceder à nomeação de sucessor ao trono de Portugal. D. Henrique havia convidado todos quantos se julgassem nesse direito a exporem por escrito as suas razões, e por sua vez hesitava entre Filipe II de Espanha e D. Catarina de Bragança, filha de D. Duarte de Portugal, 4.º Duque de Guimarães, e neta de D. Manuel I. Por sua vez, o Povo, nos seus vários estratos, queria aclamar D. António, Prior do Crato, neto de D. Manuel I, por recear a perda da independência de Portugal. No final de Janeiro de 1580, D. Henrique faleceu sem ser designado o herdeiro.
A 24 de Julho de 1580, D. António I foi Aclamado Rei pelo Povo no Castelo de Santarém e, depois em Lisboa e Setúbal.


Consequentemente, em Novembro de 1580, Filipe II de Espanha, incumbiu o Duque de Alba de invadir Portugal para reivindicar o Reino à força. Às mãos do mais poderoso exército europeu, à época, após a Batalha de Alcântara, em que num derradeiro acto de heróica resistência D. António comandou o que sobejava da cavalaria e o povo mal-armado de Lisboa, a Capital caiu rapidamente e o rei espanhol foi proclamado Rei de Portugal, sobretudo pela alta nobreza, mas com a condição de que o reino de Portugal e seus territórios ultramarinos não se tornassem províncias espanholas.
D. António decidiu então levar a resistência para Norte – sempre mais desafecto a ceder na sua liberdade e independência – e, juntamente, com um povo armado apenas de paus, pás e foices, libertou Coimbra, a seguir Aveiro, depois o Porto e foi até Viana da Foz do Lima, onde a clara hegemonia das tropas castelhanas se fez sentir, obrigando o 18.° Rei de Portugal a fugir. Filipe de Espanha ofereceu uma recompensa de milhares de ducados a quem capturasse Dom António “vivo ou morto”, mas o “Prior do Crato” refugiou-se no arquipélago dos Açores, e dessa forma Angra (desde o séc. XIX ‘do Heroísmo’) foi capital do reino de Portugal entre 5 de Agosto de 1580 e 6 de Agosto de 1582, enquanto D. António, Prior do Crato, ali estabeleceu o seu governo, onde inclusive cunhou moeda. A estocada final na independência do Reino e no reinado de Dom António, foi a Batalha Naval de Vila Franca, travada no dia 26 de Julho de 1582, em Ponta Delgada, a sul da ilha de São Miguel, Açores, entre uma esquadra aliada luso-francesa, comandada por Filippo Strozzi, e uma armada espanhola, que incluía parte da armada portuguesa afeta a Filipe I (II de Espanha), comandada por Don Álvaro de Bazán, Marquês de Santa Cruz, que utilizou pela primeira vez numa batalha naval, os grandes galeões, Assim, em inferioridade as forças luso-francesas foram derrotadas, seguindo-se um violento massacre dos castelhanos sobre os portugueses, em Vila Franca do Campo – sendo o maior de que há memória nos Açores. A hecatombe causou, entre a batalha naval e a subsequente chacina, um total de 2.500 mortos.
O Determinado, o Lutador ou o Independentista, como, também, foi cognominado, teve de partir para o exílio. Não obstante, e por tudo o explanado, a Plataforma de Cidadania Monárquica, a exemplo, da maioria dos Monárquicos reconhece que Dom António de Portugal, Prior do Crato, foi o 18.° Rei de Portugal, e o último Monarca da Dinastia de Avis, como Sua Alteza Real El-Rei Dom António I de Portugal.
Mas. continuando a crónica dos factos, Filipe II invadiu Portugal e foi aclamado rei, iniciando a União Ibérica que durou até 1640.
Durante o Domínio Filipino da nossa Pátria, sobretudo no de Filipe III (IV de Espanha), Portugal, na prática, tratava-se de província espanhola, governada à distância, por quem não demonstrava qualquer cuidado com os interesses e anseios dos portugueses.
No início do reinado de Filipe III, então com 16 anos, em 1621, instalou-se em Madrid a política centralista de Gaspar Filipe de Gusmán, Conde-Duque de Olivares, plasmada no seu “Projecto Instrucción sobre el gobierno de Espanha”, de 1625, apontada à obliteração da autonomia portuguesa, abduzindo por completo o Reino de Portugal.
O conde-duque de Olivares foi um nobre e político espanhol do século XVII, III conde de Olivares, I duque de Sanlúcar la Mayor, I duque de Medina de las Torres, I conde de Arzarcóllar, I príncipe de Aracena e valido do rei Felipe IV da Espanha. Seu nome completo era Gaspar de Guzmán y Pimentel Ribera y Velasco de Tovar. Ele nasceu em 6 de janeiro de 1587 em Roma, Itália, e faleceu em 22 de julho de 1645 em Toro, Espanha . Ele é conhecido por ser o principal conselheiro do rei Felipe IV e por ter desempenhado um papel importante na política espanhola durante o século XVII.
Este documento de intenções apontava três sentidos

1º – Realizar uma cuidadosa política de casamentos, para confundir e unificar os vassalos de Portugal e de Espanha;
2º – Ir o rei Filipe IV fazer corte temporária em Lisboa;
3º – Abandonar definitivamente a letra e o espírito dos capítulos das Cortes de Tomar (1581), que colocava na dependência do Governo autónomo de Portugal os portugueses admitidos nos cargos militares e administrativos do Reino e do Ultramar (Oriente, África e Brasil), passando estes a ser Vice-reis, Embaixadores e oficiais palatinos de Espanha.

A Governação dos Filipes transformara-se em tirania. Como de simples nativos se tratassem, os habitantes serviam unicamente para serem visitados pelo cobrador de impostos. Este confisco em nada beneficiava o País, pois o tributo não era repartido para fruir as necessidades e premências de Portugal e o bem comum dos naturais, mas ajudavam tão só a custear as despesas do Império espanhol.
Foi sobretudo esta política fiscal que abriu o caminho para a Restauração. Ainda, em 1628, aconteceu o Motim das Maçarocas, no Porto, revolta contra o imposto do linho fiado; depois, em Agosto de 1637, foram os protestos e a violência, que ficaram conhecidas por Alterações de Évora, e que tiveram origem no aumento do imposto do real de água e a sua generalização a todo o Reino de Portugal, assim como o aumento do imposto da Sisa elevado para 25%. Apesar da revolta ter sido instigada pelo Procurador e pelo Escrivão do povo – acicatados ainda pelo imposto da meia-anata -, numa manobra para manter o anonimato dos impulsionadores, as ordens para a marcha da insurreição surgiram assinadas pelo ‘Manuelinho’, um pobre demente da cidade alentejana. As Alterações de Évora, contagiariam todo o País e alastraram a Sousel, Crato, Santarém, Tancos, Abrantes, Vila Viçosa, Porto, Viana do Castelo, Bragança, Beira e Algarve.
Vulgarizam-se os panfletos populares contra Filipe III (IV):

‘Que teve em ti Portugal?
Grande mal.
E de seres seu Senhor?
Gram rigor.
Que teve dos castelhanos?
Grandes danos.’

Desta forma, o descontentamento era transversal a toda a Sociedade portuguesa: a Nobreza via os poucos cargos de administração que, ainda, sobejavam no Reino de Portugal – uma vez que a Corte estava em Madrid -, e, que outrora haviam sido dos seus antepassados, ocupados pelos ocupantes estrangeiros. Além disso, eram obrigados a alistar-se no exército espanhol suportando todas as despesas, e os que a sua idade já desobrigava da prestação obrigatória do serviço militar retiraram-se para a província, onde viviam nos seus palacetes e solares subsistindo com o mínimo de dignidade que impunham os pergaminhos de família.
Também, a Burguesia estava desiludida e em rota de colisão com a pobreza, pois em consequência da belicosidade castelhana com as demais nações europeias, os territórios e navios portugueses eram atacados e saqueados, ficando os corsários Ingleses, Franceses e Holandeses, com os produtos originários dessas terras e que outrora, os portugueses, comerciavam proveitosamente. Assim, comércio e respectivo lucro haviam caído a pique.
Apesar da insurreição de Évora, em 1637, não ter derrubado o Governo pró-Castela de Lisboa, consequência da repressão das tropas castelhanas que vieram em seu auxílio e que evitaram logo ali a revolução, já ninguém podia mudar o curso das vontades independentistas.
A Restauração da Independência de Portugal foi um processo histórico que procurou a autonomia portuguesa após sessenta anos de União Ibérica (1580-1640). A União entre as coroas não teve aprovação homogénea de ambos os lados desde seu início . A Restauração teve apoio de nobres e aristocratas, que se vinham organizando desde 1638 contra as políticas de descentralização e neutralização, administradas pelo duque de Olivares. O novo rei não foi aclamado como o esperado e ainda teve que encarar a desconfiança do povo, que aguardava o retorno do rei encoberto que os libertaria do jugo espanhol. Foi o messianismo Bragantino que acabou por ser utilizado para legitimar a ascensão de D. João IV, baseado na lealdade dos nobres e na dinastia que descendia de D. Manuel. Acompanhado do surgimento do nacionalismo na figura do Quinto Império, procurava relacionar as glórias do passado e vitórias do futuro.


Para isso muito contribuiu Gonçalo Annes Bandarra, ou ainda Gonçalo Annes, o Bandarra, um autor, profeta e sapateiro Português, nascido em Trancoso, autor de Trovas Messiânicas que ficaram posteriormente ligadas ao sebastianismo e ao milenarismo português.


‘Se Portugal foi grande,
muito maior há-de ser,
quando um Divino poder,
vier de longe e o mande’.

‘Está a aproximar-se a hora, e o dia da formação,
de uma tão grande nação, que todo o mundo ignora.
Nesta nação nascerá, o Quinto Império do mundo,
quando vier o Segundo, do lugar onde ele está.’

Muitos viram nesta profecia do ‘segundo’ que se referia a D. João II de Bragança, II porque a exemplo dos Reis os Duques de Bragança têm numeração. As Trovas nas quais Bandarra falava do futuro de um povo que se havia de cumpri, denotavam um conhecimento das escrituras do Antigo Testamento, do qual fazia as suas próprias interpretações, tendo composto uma série de “Trovas” falando sobre a vinda do Encoberto e o futuro de Portugal como reino universal. Por causa disso, foi acusado e processado pela Inquisição de Lisboa, desconfiada de que suas Trovas contivessem marcas de judaísmo. Foi inquirido perante este tribunal, condenado a participar na procissão do auto de fé de 1541 e também a nunca mais interpretar a Bíblia ou escrever sobre assuntos da teologia. Apesar da grande aceitação de suas Trovas entre os cristãos-novos, não se sabe ao certo se era ou não de ascendência judaica. Após o julgamento voltou para Trancoso, onde viria a morrer, provavelmente, em 1556. As suas “Trovas”, em parte por conta do interesse despertado entre os cristãos-novos mas sobretudo por conta de seu sucesso após Alcácer-Quibir (1580), foram incluídas no Catálogo de Livros Proibido, em 1581. Logo após ser notificado pelo Santo Ofício, Bandarra decidiu refugiar-se na pequena Aldeia Velha, a sudoeste da vila de Trancoso.
As Trovas circularam em diversas cópias manuscritas, apesar da interdição do Santo Ofício. Em 1603, D. João de Castro editou-as e comentou-as numa obra impressa em Paris e intitulada Paráfrase e Concordância de Algumas Profecias de Bandarra. As Trovas foram interpretadas como uma profecia ao regresso do Rei D. Sebastião após o seu desaparecimento na Batalha de Alcácer–Quibir em Agosto de 1578.
Em 1639, D. João, o 8.° Duque de Bragança, recém-nomeado Governador de Armas do Reino, instalou-se em Almada onde começou a receber a visita da nobreza e fidalguia, entre os quais D. Francisco de Mello que lhe começa a incutir as ideias da Restauração da independência.
Escrevera, o Bandarra:

‘Saia, saia esse Infante bem andante,
O seu nome é D. João
Tire, e leve o pendão, E o guião
Poderoso e triunfante.
Vir-lhe-ão novas num instante
Daquelas terras prezadas,
As quais estão declaradas
E afirmadas pelo Rei dali em diante.’

Após sessenta anos de jugo castelhano, Portugal estava exaurido pelo imposto, com a economia de rastos, sem a outrora Marinha de causar admiração, despovoado pela mobilização de recrutas para combater as guerras de Filipe III e do Conde-Duque de Olivares e, também, uma outra vez os Três Estados estavam unidos no mesmo desiderato. Crescia a crença do Sebastianismo a que ajudavam as visões feitas profecias do sapateiro Bandarra; elevado a áugure. Tudo confluía para a necessidade e possibilidade de um novo Rei Português. Para Coroar o Reino com sangue portucalense como futuro Rei Dom João IV de Portugal. quem melhor do que o trineto de Dom Manuel I, o Venturoso: Dom João II de Bragança, Duque de Bragança, Conde-Duque de Barcelos, Duque de Guimarães e Marquês de Vila Viçosa.
Então, os acontecimentos precipitam-se, pois eclode uma revolta na Catalunha, também, contra o centralismo do Conde-Duque de Olivares. A 7 de Junho de 1640, O rei Filipe III (IV de Espanha) convoca Dom João (II) de Bragança para o assistir na viagem à Catalunha e colaborar na campanha de repressão que ia empreender. O Duque de Bragança enjeitou a convocação de Filipe IV, no que foi seguido por muitos nobres portugueses que receberam idêntica intimação, recusando-se também a obedecer a Castela.
Foi, então, que, secretamente, se congregou um grupo de Nobres – que viriam a ser denominados de Conjurados. Nas suas reuniões, no Palácio dos Almadas, propriedade de Dom Antão de Almada, 7.º Conde de Avranches, o grupo patriótico português nascido clandestinamente, começou a analisar e engendrar a melhor forma de revolta contra o domínio castelhano. Principiaram então a tecer uma revolta que desse garantia de êxito.


Na segunda quinzena de Outubro acontece um encontro entre Pedro de Mendoça Furtado e Dom João II de Bragança onde o Duque é instigado a assumir o seu dever de defesa da autonomia portuguesa, assumindo o Ceptro e a Coroa de Portugal: segundo o direito consuetudinário do País, pelo direito da representação Dom João II de Bragança era o candidato natural e legítimo, pois era filho varão primogénito do 7.º Duque de Bragança, D. Teodósio II, e como tal neto de D. João I de Bragança e da Infanta Dona Catarina, Duquesa de Bragança, e tal como Filipe I, neta d’ El-Rei Dom Manuel I de Portugal. Filipe I, sendo um Príncipe estrangeiro, não tinha direito ao trono português, tanto mais que havia, segundo estas leis do País um candidato natural e legítimo: Dona Catarina, Duquesa de Bragança, pois a Lei portuguesa não afastava as mulheres da sucessão ao trono.
Dom João II de Bragança mostra-se favorável, mas reserva uma resposta definitiva para depois de umas consultas com o Marquês de Ferreira, o Conde de Vimioso, o secretário António Paes Viegas e a própria Duquesa de Bragança, D. Luísa de Gusmão. Todos se mostrando favoráveis, Dom João II de Bragança decide apoiar incondicionalmente o coup.

Miguel Villas-Boas | Plataforma de Cidadania Monárquica


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♔ | ‘A Monarquia é um sistema admirável de resolver o problema da chefia do Estado.’

Francisco Sousa Tavares | Advogado, Jornalista, Político e Monárquico português in ‘Monarquia Portuguesa’, Jornal Monárquico Independente, n°11, 1983

’Nas grandes crises nacionais, nas épocas em que a Nação busca ansiosamente rumo, como é a nossa, só o Rei tem a virtualidade de se identificar com todos e com ninguém, de «servir», de realizar todos os ideais sem com eles se confundir, de consentir todas as esperanças sem que uma exclua ou mate necessariamente as outras.
Não será necessário que a Nação viva livremente e que como outrora, da pujança nacional brotem gradualmente as formas genuínas da liberdade, da convivência e da política do homem português?
E quem garante a vida livre da Nação? Quem tem por si o dom de El-Rei, o dom da serenidade no poder, o dom de deixar, sem medo, brotar a liberdade?’

Francisco Sousa Tavares | Jornalista e Político Monárquico português in “Combate Desigual – Ensaios”, 1960